O novo regime tributário e o produtor rural na Reforma Tributária (Regulamentação pela LC 214/2025)
- Carolina Nogueira Queder
- 1 de out.
- 3 min de leitura
A Lei Complementar 214/2025 regulamenta o novo modelo tributário de consumo instituído pela Emenda Constitucional 132/2023, criando os tributos IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e CBS (Contribuição Social sobre Bens e Serviços).
Para acomodar as particularidades do agronegócio e preservar a competitividade dos produtores rurais, a LC 214/2025 prevê regimes diferenciados para esses agentes, especialmente nos artigos 164 a 168.
O ponto central é: nem todo produtor rural será contribuinte automático do IBS/CBS. A lei estabelece critérios para que um produtor seja considerado não contribuinte, bem como regras para aqueles que optarem ou forem compelidos a ser contribuintes regulares.
Principais pontos:
O artigo 164 estipula quem não é considerado contribuinte.
“O produtor rural pessoa física ou jurídica que auferir receita inferior a R$ 3.600.000,00 no ano-calendário e o produtor rural integrado não serão considerados contribuintes do IBS e da CBS.”
Alguns parágrafos complementam esse dispositivo:
O produtor rural integrado — em contrato de integração vertical — é definido e tratado de modo diferenciado.
Caso o produtor ultrapasse o limite de receita anual no decorrer do ano, ele passa a ser contribuinte a partir do segundo mês subsequente ao excesso — salvo se o excesso for inferior a 20%, hipótese em que os efeitos só se aplicam no ano seguinte.
Em caso de início de atividade no meio do ano, o limite é proporcional ao número de meses de atividade.
Se o produtor rural tiver participação societária em outra pessoa jurídica que pratique atividade agropecuária, o limite de R$ 3,6 milhões será considerado com base na soma das receitas dessas entidades. Essa previsão tem caráter antielisivo, tentando coibir estratégias de segmentação artificial de receitas.
Em resumo: para ser considerado “não contribuinte”, o produtor rural (físico ou jurídico) precisa que sua receita anual agrícola fique abaixo de R$3,6 milhões, e ele pode estar em regime de integração. Além disso, não pode haver segmentação societária para burlar o limite.
Mesmo sendo elegível ao regime de não contribuinte, a LC 214/2025 permite que o produtor opte pelo regime regular de contribuinte do IBS/CBS.
Características dessa opção:
A opção é irretratável para todo o ano-calendário em que for feita e aplica-se aos anos subsequentes.
A renúncia à opção poderá ser feita, observando-se regras específicas previstas no regulamento, e terá efeito a partir do primeiro dia do ano-calendário seguinte.
Isso gera que muitos produtores rurais “média escala” precisem decidir: permanecer como não contribuinte, com algumas limitações, ou migrar para regime contribuinte para captar vantagens relativas aos créditos.
Principais impactos e desafios
Decisão estratégica de regime
Muitos produtores rurais terão que decidir entre manter o regime de não contribuinte (com algumas limitações) ou optar por ser contribuinte para capturar crédito e alinhar sua cadeia.
Competitividade e escolha do adquirente
Compradores poderão preferir adquirir de fornecedores que geram crédito mais vantajoso (contribuintes do regime regular) em lugar de produtores não contribuintes, se o crédito presumido concedido for inferior ao crédito normal.
Incerteza quanto aos percentuais de crédito presumido
Os percentuais de crédito presumido serão fixados anualmente, o que gera insegurança, pois podem ser baixos, reduzindo o estímulo ao produtor não contribuinte.
Complexidade operacional e de compliance Produtores que optarem por regime contribuinte precisarão adaptar seus sistemas de contabilidade, emissão de notas, apuração de crédito/debito etc.
Risco de enquadramento automático Se ultrapassarem o limite de receita, os produtores migrarão automaticamente ao regime de contribuinte, trazendo obrigações que não estavam acostumados a cumprir.
Questões tributárias relativas à receita bruta Há debates importantes sobre como será apurada a receita bruta: pelo regime de caixa ou competência? Quais receitas serão consideradas (somente da atividade rural ou outras)? Qual será o tratamento de vendas com entrega futura, adiantamentos etc.?
Norma antielisiva e somatório de receitas societárias A LC já prevê uma norma antielisiva: se o produtor tiver participação societária em outra empresa agropecuária, suas receitas serão somadas para fins de limite de R$3,6 milhões. Isso restringe manobras de segmentação artificial de receitas.
Conclusão
A LC 214/2025 introduz mudanças profundas na forma como o produtor rural será tratado no novo sistema tributário de consumo (IBS/CBS). O artigo 164 é peça-chave desse regime diferenciado: define quem será não contribuinte e estabelece critérios claros de limitação de receita, possibilidade de opção, regras de migração e tratamento societário.
Os impactos tributários são significativos: produtores não contribuintes perdem o direito ao crédito “normal”, mas seus adquirentes podem contar com crédito presumido. Já os contribuintes ganham direito a crédito em suas aquisições, mas assumem a obrigação de recolher e cumprir obrigações fiscais mais complexas.
É um momento decisivo para o produtor rural: exige planejamento tributário cuidadoso, análise de cenários e monitoramento dos atos regulatórios que definirão percentuais, regulamentações e procedimentos concretos.
Comentários